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terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Cabañas e a “interatividade” do torcedor

O caso é o extremo a que se pode chegar, mas é também emblemático para se pensar um pouco mais sobre a tal “interatividade” que tomou conta da mídia desde que se revolucionou a relação das pessoas com os meios de comunicação.

O tiro dado por um torcedor mexicano na cabeça do meia Cabañas, aparentemente por um desentendimento pela performance do paraguaio dentro de campo, revela um pouco mais sobre a relação cada vez mais bélica entre as pessoas. E que, a cada dia que passa, se expressa nas ferramentas de interatividade que são liberadas para o torcedor na mídia em geral.

Não, longe de ser contra essa possibilidade de dar “voz” ao consumidor da mídia. Pelo contrário. É fundamental para o desenvolvimento da mídia nos dias atuais colocar o seu cliente na condição de gerador do próprio conteúdo.

Só que a pergunta que não se cala, ainda mais quando acontecem casos como o de Cabañas, é uma só: o consumidor está preparado para essa interatividade?

À exceção de alguns fóruns específicos, geralmente o que se vê por aí é uma agressão aparentemente sem fim de quem tem direito a opinar sobre um determinado assunto. O colunista não falou o que se esperava? É porque ele conspira contra o seu time. O tema não lhe diz respeito? É porque o autor é um “chato”, “vendido”, “desinformado”. O torcedor não se conforma com um atleta ou dirigente, e dá-lhe críticas contra a sua honra, sua família, etc.

O pior é que essa agressividade do torcedor, aparentemente, não tem se resumido a veículos em que ele pode se “esconder” sob o anonimato, com pseudônimos, e-mails falsos e afins.

O que era para ser a era em que as pessoas teriam um acesso muito maior ao debate, à troca de ideias, à democratização no consumo da informação tem, infelizmente, revelado o lado mais triste de toda essa história.

E o caso de Cabañas é uma espécie de personificação disso. Em vez de argumentar, de tentar entender a mensagem, de tolerar aquele que erra, ou que simplesmente pensa diferente de você, a pessoa toma a via da agressão. Não tolera o erro, o diferente, o que lhe decepciona.

Não é preciso dar um tiro na cabeça de alguém para que ocorra um crime. É hora de começar a se pensar, mundialmente, numa forma de criminalizar a agressão, a injúria, a difamação e qualquer coisa do gênero também nos fóruns de discussão via web. Só assim, provavelmente, para que as pessoas tenham mais coerência na hora de opinar.

Liberdade de expressão não significa liberdade para agressão.



Por Erich Beting

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